terça-feira, 4 de novembro de 2008

Eloá e Lindemberg

Paixões nem sempre acabam em final feliz , ao contrário, na maioria das vezes tem um " trágico fim".
Por que homens e mulheres se maltratam , apesar de sentimentos intensos e amorosos ? Qual a raiz da violência quando tudo parece florido?
Estruturas egóicas frágeis quando se apaixonam fundem-se de tal forma que deixam de existir o Eu e Tu, e passa a existir apenas um EU : " Você e eu somos UM ".
Esses espaços mal definidos , acabam por sobreviver durante o tempo de gestação de fantasias. Os " dois " não mais pensam por si, não enxergam por si, e acabam sonhando acordados , uma realidade que está por nascer ou por morrer. As estruturas da personalidade de cada um , passam a erguer-se com ajuda mútua e ambos dependem do brilho do outro e da existência do outro. Morrem a individualidade e a identidade. Há de haver um terceiro para romper o cordão . Apenas uma nova paixão soluciona a ilusão ou a desilusão .
Eloá não poderia deixar Lindemberg porque Lindemberg jamais poderia deixar Eloá . Triângulos mágicos surgem da necessidade de romper com a certeza de que haverá alguém no mesmo lugar. Sempre existe um terceiro para quebrar a unidade.
Relações deste tipo reconhecem o risco da perda e o ciúmes surge como consequência e defesa.
Lindemberg hoje vive, mas não existe, como não existia antes de conhecer Eloá.
Casamentos e uniões do tipo " unidos " para sempre, podem incluir sentimentos de ódio que se intercalam com o amor que um sente pelo outro. Ao mesmo tempo que o amor surge passional, o ódio entra, ao perceber que o outro é incapaz de realizar todos os ínfimos desejos.
Muitos são os casais que se odeiam e se amam, como numa " gangorra" . Os desencontros são maiores do que os encontros. A necessidade de submeter o outro aos próprios caprichos é a forma de mostrar que não houve perda do controle à medida que a "obediência " e submissão asseguram que a suposta relação não foi extinta . o "amado " obedece aos comandos , como um fantoche em cena. O poder em mãos de alguém que nunca se sentiu alguém e o medo do vazio e da própria solidão , paralelos ao ódio de depender de alguém que será sempre um ninguém .
Assegurar-se de que o outro é um nada , é ter a certeza de que a solidão nunca chegará ao mesmo tempo que sempre existirá. Ao invés de um amado, apnas um objeto de prazer , inerte , sem vida .
A morte de Eloá, assegura ao algoz a certeza de que nunca viverá sem sua própria imagem. Matar a imagem é ter a certeza de que não será abandonado por si mesmo. Traído por si mesmo . É o fim da simbiose. É o fim do drama.
Simbolicamente , quantos casais permanecem em relações doentias, impedidos de libertarem-se? Pedem socorro pelas janelas gritando ao mundo : " Terminem logo com a cena, dêem um limite, entrem e impeçam que dois seres vivam tantas angústias . Dêem o primeiro tiro , para que sem culpa , a tragédia do cotidiano se encerre. Que morra este amor sufocante ".
As " novelas " do cotidiano chocam a toda a sociedade quando envolvem personagens
comuns que mesmo não sendo atores, comovem e impactam mais do que os crimes mais banais que já nos acostumamos a conviver.
Culpa do Governo, do desgoverno, ou de todos os pacatos cidadãos da civilização?

Míriam Stolear
Rio, 04/11/2008